You are currently browsing the monthly archive for novembro 2008.
Quero habitar
O silêncio
Quero dizer
Somente
O momento
Que antecede
O murmuro
Anterior ao anterior
Da palavra
Interior da palavra
A intenção da letra
A pronúncia do pensamento
Quero habitar o silêncio
Para não proteger o que sinto
Nem mesmo
Com o teto
De um verso
Everton Behenck
Você coloca comida
Na janela
Para que pousem pássaros
E te contem o que é ser livre
Você lê livros
Abrindo páginas a esmo
Para que as palavras
Te escolham
Você veste um vestido verde
Porque disseram que é a cor da esperança
E a vida não te roubou
A capacidade de acreditar
Você tem um altar em casa
Mas nele há uma planta
Santa
Mas quase ninguém entende
Sua oração de água sobre o verde
Você espera um filho
Todos os meses
E aguarda o amor
Na tarde quente
Em meio a buzinas
E a fumaça dos carros
Por isso não usa
Óculos escuros
Para que o amor
Possa achar teus olhos
A primeira vista
Você deseja entre as pernas
Um orgasmo
Que te mostre um sentido
Desconhecido
E deseja que ele
Seja sua aliança
E não se importa com o perigo
Que é deixar o peito a vista
E não sabe sua força
De moça
Everton Behenck
Nessa estrela
Esquecida
No universo
O que pode um verso
De amor?
De que serve um acesso
De raiva?
Nesse planeta
De atmosfera azul
De tom blues
De que serve a música
Que toca
Oferecendo e pedindo socorro
Sem ter certeza
De onde vem
E para onde vai a tristeza
Tudo sempre volta
Nota por nota
Ao normal
E resta só
Um pequeno eco
Nesse pequeno universo
Que somos nós
De que serve essa necessidade
De inventar a eternidade
De seguir sempre adiante
Para onde?
Nesse planeta esquecido
De que servem os pedidos
De socorro
Olhando o céu
Ou as páginas de um livro
Estamos inevitavelmente perdidos
E como é bonito
Everton Behenck
Escondo
De mim mesmo
Mas não sei guardar segredos
Everton Behenck
Quero falar de amor
Mas as palavras
Me esvaziam a boca
Quero escrever aqueles versos
Antigos de amor sincero
Mas eles são
A infância
E não sei mais
Daquela inocência
Quero dizer de novo
Que ela seria
O ponto
De chegada e partida
Mas já existem tantos calos
Para calar os passos
Que ficar parado
Já é dor suficiente
Quero falar de amor
Mas a voz está presa nos dentes
Everton Behenck
A duras penas
Pena o peão
No tabuleiro
De concreto e canteiro
De obra
Um prato à mesa
A cesta básica
A coragem
Que só dá
A fome que tem
De viver
Melhor
A panela rasa
Feito a cova
Que não tem para cair
Mestre na arte de insistir
Mestre de obra
Nesse ofício
De se manter vivo
Quanto sorriso
Em sua ausência
Quanto ritmo
Em seus calos
No tijolo do seu peito
Um rachado
Bem no meio
Divide a pedra do pedreiro
E não há cimento
Que concerte o sentimento
De estar sempre fora
De casa
Everton Behenck
Minha defesa
É a cegueira dos dentes
No que mordem
O rosnar de um verso
Essa consciência
De que nada
Será explicado
E de que o último momento
Será de imensa solidão
E medo
Ao mergulhar no segredo
Me defendo
Na aceitação de que escrevo
Querendo me despir
Mesmo sabendo
Que essas roupas não servem
A ninguém
E que ninguém verá minha pele
E que tudo o que digo
É breve e raso
E que não saberei dizer
O que sinto
Porque esse idioma
Ainda não foi inventado
Há sempre uma margem
Da linguagem
Que não pode ser alcançada
Por nenhuma palavra
Tento me defender
Na esperança
Rarefeita
De um amor
Mesmo quando despedaço
O sentido frágil
A mulher é um destino inevitável
E no amor
Somos humanos
Ao menos um pouco
Me defendo nos planos
De manter a dignidade
Cultivar meu caráter
Mesmo que aos olhos
Alheios
Ele não caminhe reto
Ao que acham certo
Me defendo seguindo a certeza
Estreita
Da minha natureza
Everton Behenck
Essa saia
Guarda mais
Do que há sob ela
Guarda os olhos
Que sobem as coxas
Até sumir o olhar
Na pele
Guarda as mãos
Que descobrem
Os centímetros
Das pernas
E só descansam
Entre elas
Essa saia
Guarda mais
Do que há sob ela
Guarda a boca
Que só encontra palavras
Em teu gosto
Guarda a expressão
Do rosto
No gozo
Essa saia
Guarda mais
Que tuas pernas
Guarda um homem inteiro
Se perdendo
Everton Behenck
Fiz um verso
Raio de sol
Para entrar na janela
Iluminar lá dentro
Com um sentimento
Leve
De que nessa vida
Tudo é breve
Até a dor que parece
Daquelas que não se esquece
Fiz um verso
Menina de saia
Brincando com a casa
De bonecas
Para ser sorriso inevitável
Para teus olhos de céu
Não ficarem nublados
Fiz um verso
Flor no vaso
Everton Behenck
Ela bebeu
A água dos meus olhos
E seu beijo passou a dizer versos
De amor
Eu toquei seus medos
Com a ponta dos dedos
No canto dos olhos
Azuis
E minha mão aprendeu a consolar
E seu rosto perfumou
Em um sorriso para mim
Ela engoliu meu corpo
Como se fosse
De lá que viesse
A vida
E dentro dela nasceu uma prece
Para que nada em nós
Morresse
Everton Behenck