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Inventamos a linguagem da distância

A voz da distância

A fala grave da distância

O idioma
Do que está longe

Inventamos a audição
Da distância

No que diz o vento

E ele repete
Nosso tempo

E nos conta

Dominamos a distância
Para inventar uma forma

De cobrir os olhos da falta
Para que ela nunca nos olhe

De volta

A forma como tua foto
Vai ficando cada vez mais abaixo

Na coluna do Whatsapp

O ícone apagado
No Livro das Faces

Uma silhueta ridícula
Onde havia o amor de uma vida

As conversas esquecidas
Na linha do tempo

Elas não desaparecem
Seguem dizendo

Não são como minha voz
Repetindo agora

Que te amo

E de nada serve

Como a prece
De quem não acredita

Quem já viu sumir um rosto?

Desaparecer os olhos
Os cílios longos

A cor dos cabelos

Quem já viu
Sumir o amor

Sumir uma filha
Uma família

Ela existia
Eu via tudo

No futuro
Dos olhos escuros

Você aos quarenta anos

Seremos outros
E eu meu amor

Não quero saber

De te encontrar de novo
Em outra vida

Preciso da vida
Vivida

E não viveria
Longe de você

Se pudesse escolher

Preciso
Viver isso

Não aquilo que me espera
Onde quer que você não esteja

Há quem queira
Amar dessa maneira?

Se ausentar dos sentidos
Completamente

Não ver
Não sentir
Não ouvir
Não tocar

Deixar passar
O que é fixo

Fingindo

Que não foi preciso
Mais do que algumas palavras

Para que o mundo em volta
Se reduzisse a nada

Sou eu

O fantasma

Sentado à mesa

O vulto para o qual
Acena tua cabeça

Com plena certeza
E não vê nada

Pois, sou eu
Esse nada

Que no entanto
Está presente

Sou eu que você
Pressente

Era eu
Caminhando na estrada

Enquanto teu carro passava

Sou eu o fantasma
Que abandona seu corpo

Para viver em um punhado
De palavras

Homem feito da sombra
Em tua janela

Não sou um homem de verdade

Sou apenas a imagem de um homem

Aqui, não estou
Nem estou aí

Deixei de existir

Inventei as asas
Me roubaram o céu

Quis cavar o chão

Mas as unhas do fantasma
Atravessaram a terra

Sem nada conter

Quis me olhar no espelho
Nada vi

Não tenho imagem
Nem posso ser reconhecido pelos amigos

Mudei de mim sem que ninguém visse
Me mudei para dentro de ti

E nunca cheguei

Não sei o caminho da ida
Nem o caminho da volta

Fiquei vulto

Carregando todo o ouro
Todos os pertences

Toda beleza que podia

E vão caindo pelo caminho
Chamando atenção de mendigos e bandidos

Tento proteger o peito
Sou abatido constantemente

Mas fantasmas não morrem
Fantasmas ardem, apenas

E vagam

E eu sigo
Sem ter destino nem passado.

Eu, em que tudo se degenerou e reconstruiu
Sem no entanto concluir

Eu que vivo para ti
Sem nunca ter te visto.

Eu que rondo tua casa
Sem saber teu endereço.

Eu que fiz um filho em ti
Sem nuca ter te tocado

Eu que levantei teu véu
Sem nunca ter te beijado

Eu que atrapalhei tua família
Sem nunca ter lhes apertado as mãos

Eu que fui teu ultimo homem
Sem nunca ter chegado

Eu que simplesmente
Joguei fora o pensamento

Eu que não sei

Tenho certeza da nossa sorte
Ao desconstruirmos nossas vidas

Em nome de algo
Muito maior que a própria vida

O casal. O espelho. O amor. O par.

A possibilidade de criar a vida
Não como faz um bicho

Mas como faz o que é divino